Cordilheira dos Andes de Carro

Estávamos super empolgados, realizaríamos o que já estava sendo programado há duas férias.
Viajamos de carro, com o sonho de desbravar a imponente Cordilheira dos Andes e com toda a certeza de que seria o ponto alto da viagem até o Chile.
Rodamos 7.000 kilômetros,
600 litros de combustível
e 1.001 histórias para contar!
Saímos de Joinville na quinta feira dia 22/12, a previsão era chegar em Dionísio Cerqueira/SC fronteira com a Argentina na cidade de Bernardo de Irigoyen ainda de dia, mas como acabamos nos atrasando na saída de casa chegamos ao anoitecer, foram 723 Kilômetros até aqui pernoitamos no Hotel Iguaçú , café da manhã, ar condicionado e com garagem, para nós que estávamos de carro um ítem de total importânica.
Dica: Viajando de carro, programe a saída o mais cedo possível pela manhã, o dia será mais proveitoso e menor serão os seus gastos em paradas para almoço/lanches e pernoites.
Sexta Feira 23/12 - Saímos cedo do hotel e nos deparamos com 02 situações que nos causaram uma leve dor de cabeça, sem contar com a irritação na vista que o Guto ja havia ganho na viagem, paramos em uma farmácia e compramos um colírio, este não tínhamos na nossa Farmacinha, não esquecendo que na Argentina o Kit de Primeiros Socorros é Obrigatório! Descobrimos que para cruzar o país teríamos que estar vacinados contra a Febre Amarela (Dor de Cabeça nº 01) e também possuir a Carta Verde (Dor de Cabeça nº 02) Para a nossa sorte estávamos quase ao lado do único Hospital da cidade, o qual nos atenderam muito bem. O Guto quem diga, quase chorou com a injeção, queria de gotinhas! (haha-ninguém merece!!! ) Saímos de lá com as solicitadas carteirinhas e vacinados, fomos direto a uma agência de seguros, (essas tinham mais opções) mas na primeira que paramos já fechamos o tal Seguro Internacional contra terceiros, conhecido como Carta Verde, mais um ítem obrigatório para a nossa entrada na Argentina.
Com todas as exigências cumpridas passamos na Aduana (bem tranquilo) e metemos o pé na estrada.
Mais um dia com a parte da manhã praticamente perdida, porém, o excelente estado de conservação das rutas e o pôr do sol que demorou a chegar, hj anoiteceu ás 21 horas (aqui tmbém tem o horário de verão) conseguimos rodar mais que no 1º dia de viagem, hoje foram 897 Kilômetros até Santa Fé, pernoitamos no Hotel Avellaneda (Ruta 11 Km 792), com todos os requisitos básicos exigidos: ar condicionado, garagem e "café da manhã" - o que foi servido Café/Leche e Croissant´s, bem diferente dos hotéis brasileiros com muitas opções e mesa farta de frutas.

Sábado 24/12, hoje conseguimos sair cedo, ás 07hs da manhã já estávamos viajando, estamos cortando praticamente toda a Argentina com sol de 40 graus na cabeça.
Retas e mais retas, são intermináveis kilômetros na imensidão de asfalto,
pastos limpos e verdejantes, gado gordo e bonito, não é a toa que a carne argentina é muito apreciada, o bicho não ganha músculos, pouco morro é quase tudo plano e eles engordam sem muitos esforços, o que garante uma carne saborosa e macia.
Acabavam os pastos e começavam os maravilhosos Campos de Girassóis formando tapetes ao longo da estrada.
Além de tudo isso, de rutas pedagiadas em valores risórios com asfalto limpo e perfeito, a gasolina aqui é muito barata! A Nafta Super, muito melhor que a nossa Brasileira por $1,78 ( R$ 1,48, pagamos por R$ 2,50 o litro na nossa cidade).

Mais algumas horas de viagem e tivemos a primeira situação complicada/delicada com os senhores policiais argentinos, um carabineiro fdp querido inventou que estávamos em uma velocidade absurda e não tivemos outra alternativa a não ser dar aquele agrado, infelizmente na Argentina a maioria dos policiais são corruptos e a propina é a única saída para poder continuar a viagem!
Já estávamos sabendo que isso uma hora ou outra, na ida ou na volta poderia acontecer, e não nos deixamos abalar, olhamos para a frente e eis: 

Será ela? Ao fundo já avistávamos a nossa próxima parada, correndo contra o tempo, queríamos chegar logo! Estávamos eufóricos e não percebemos que hoje 24 de dezembro -Véspera de Natal, dependíamos de serviços básicos para a nossa sobrevivência: Posto de Combustível aberto, restaurantes e hotel, nos demos conta que nem tudo estava a nosso favor, chegamos em Medonza já era noite, uma cidade grande, não queríamos entrar nela, ficamos pelas margens e por alí não conseguimos nenhum hotel vago, o único que havia disponibilidade o lugar não era nada agradável e nosso carro tinha que ficar no lado de fora, continuamos á busca, paramos em uma Conveniência e indicaram como "melhor" alternativa seguir 100 Kilômetros rumo á Cordilheira que certamente acharíamos um lugar para pernoitar, já estávamos na marca de quase 3.000 kilômetros rodados até o momento, o que seriam mais 100?

Seriam M U I T O!!! Nos demos conta que estávamos subindo a Cordilheira dos Andes á noite!
Os 100 Kilômetros mais longe de nossas vidas! Eu ia acompanhando pelas plaquinhas de indicação - km 01, km 02... passavam horas (na verdade minutos) e quando eu olhava novamente pela janela estávamos ainda no km 10.

Atravessamos túneis, curvas e precipícios, somente com a iluminação dos faróis do carro, estava tudo escuro e morto, tive muito medo, eu queria estar alí, mas não me imaginei nessa situação, não tinha retorno nem mesmo um mirador ou viradouro, tinha apenas um pedaço de asfalto que tínhamos que trafegar, e eu com os olhos cravados em cada kilômetro que passava, quando vimos o hotel suspiramos aliviados - estamos salvos!
Quando fomos chegando confirmei o que não queria admitir, era realmente o hotel que haviam nos falado, era aquele sim, mas estava"cerrado"! Como assim? e agora?
Olhei para o Guto e não conseguia falar, meus lábios tremiam, a minha mão estava gelada, precisava abrir a janela para respirar mas cada vez que colocava o meu nariz para fora eu ficava com muita falta de ar e instantaneamente a ponta do nariz ficava vermelha congelada e os olhos ardiam chegando a cair lágrimas do vento gelado das montanhas, não queria saber quantos graus estava fazendo lá fora, mas estava muito frio!
O Guto manteve a "aparente calma", e continuou subindo, atingia no máximo uns 20/30 km/h, ouví muito falar que a Cordilheira com seus precipícios e curvas totalmente fechadas tornavam dela uma rodovia da morte, eu sabia que estávamos correndo perigo.
Mas como Deus é pai e não padrasto, encontramos um outro Hotel, paramos na hora, e o próprio dono veio nos atender, ele foi muito cordial inclusive nos convidou á jantar junto de sua família na noite de Natal, mas tudo o que realmente queríamos se resumia em um colchão e cobertas bem quentinhas, as exigências "básicas" aqui não entravam: o carro dormiu na rua, não tinha ar condicionado (pra quê?!), nem café da manhã, a verdade que nem lembro direito do quarto em que dormimos, nem do banheiro, este eu deveria ter lembrado, pq assim que cheguei vomitei muito, chorei...
Foi um misto de emoções,
a satisfação de estar realizando essa viagem,
o medo que passei lá em cima,
a Véspera de Natal,
familiares que estavam longe de mim...
Mas assim que conseguí organizar todos esses pensamentos, pedimos uma cerveza, brindamos a noite de Natal com uma Cristal de 01 litro e 01 mini panetone que a minha cunha querida Denise havia nos dado para um "lanchinho" na viagem, e esse lanchinho foi a nossa ceia!
Bebemos e acreditem, com apenas 01 garrafa conseguimos ficar bêbabos, pelo menos eu, adormecí em instantes igual uma criança depois de um longo dia de brincadeiras.
Ao acordar, agradecí por estarmos vivos, e claro, por toda a gentileza que recebemos do Hostel Uspallata.

Amanheceu um dia lindo, sinto um frio gostoso e um sol que chega a aquecer a alma!
O que posso dizer em estar no dia de Natal perto das nuvens?! Um Natal Mágico! 

Estamos na Cordilheira dos Andes, estamos na maior cadeia de montanhas do mundo, com mais de 7.500 kilômetros de extensão, passei vários mal´s de altitude porque estávamos em média 4 mil metros acima do nível do mar, respirar aqui em cima não é tarefa simples, depois de algumas caminhadas você acaba se acostumando, mas os pulmões sentem a diferença, tudo o que ontem nos apavorou hoje os olhos confirmam ser a coisa mais linda que enxergaram.
A Cordilheira se estende desde a Venezuela até a Patagônia, atravessando todo o continente sul-americano- paisagem garantida dos países andinos. (Chile, Argentina, Perú, Bolívia, Equador e Colômbia). O Ponto culminante é o Pico Aconcágua com seus 7.962 metros de altitude.
Lembram do filme Sete Anos no Tibet com o Brad Pitt?
Supostamente o filme se passava na Cordilheira do Himalaia, mas as filmagens foram feitas aqui no povoado de Uspallata.

A Fronteira Argentina-Chile é marcada pelo túnel Cristo Redendor, bem mais rigorosa que a do Brasil/Argentina, lá eles revistaram todo o carro, fizeram abrir caixas, malas, cada ítem presente nas nossas bagagens foi averiguado.

Após a passagem descemos os famosos Caracoles

Enfim, só estando aqui para descrever tantas belezas naturais, os glaciais, as aves, condores, pelicanos, guanacos, lhamas...
Sonhem, Viagem! Venham sentir o Cheiro da Cordilheira dos Andes, a história a magia, cada curva, cada frio na barriga, os dois intermináveis dias de calor na Argentina, tudo se compensa quando você chega aqui, é o momento que paramos e pensamos: Valeu á pena!!!

Depois de toda a experiência na Cordilheira, ainda queríamos voltar lá, claro, de uma forma diferente, uma das opções seria Portillo em uma famosa estação de esqui, a idéia seria ótima, mas como estamos fora da temporada resolvemos fazer um acampamento. Acampamos por 03 dias ao pé da Cordilheira, junto da Sandra, Rafael, Fabiola e Felipe (nossos familiares que moram aqui no Chile) escolhemos a cidade de Cajón del Maipo, apenas 45 km de Santiago, e nesses dias conseguimos desfrutar mais um pouco das belezas em volta dos Andes,
paz, sossego e muito descanso! 

O Parque La Isla, onde acampamos possuía 02 piscinas que ao meio dia com solzão forte dava para encarar (digo, os chilenos que já estavam acostumados com o clima), á tarde podia ir providenciando agasalhos, e á noite gorros e cachecóis, as temperaturas despencavam e o vento cortava!
Cada espaço reservado havia uma churrasqueira-fogão, e junto de nossas barracas passávamos o dia papeando e preparando algo para comer.
Á noite, a lenha "cantava" no fogão nos aquecendo do frio, depois já na barraca, os sacos térmicos de dormir cumpriram bem a sua função e nos mantinham quentinhos a noite inteira.
Pela manhã, o despertar era com as Lhamas e Ovelhinhas que chacoalhavam as barracas, apesar de passarem á noite em volta de nós e acostumadas com a presença humana, com a nossa movimentação elas fugiam para descansar em outros lugares.
Mas como diz o ditado: O que é bom dura pouco, porém dura o suficiente para se tornar inesquecível!
E realmente foi, sempre recordaremos com carinho a nossa aventura na Cordilheira dos Andes. (Dezembro 2005 - Janeiro 2006)